Costeletas de capado à moda de Mangualde

 



Apesar de hoje a carne de porco, particularmente as febras e o entrecosto, constituir o elemento primordial dos pratos mais típicos de Mangualde, num passado não muito distante a realidade era bem diferente.  O Porco era, de facto, muito importante na alimentação quotidiana, aqui, como em todo o país. As chouriças, o presunto, a marrã, as morcelas, o toucinho e a banha faziam parte do quotidiano beirão.  As carnes guardavam-se religiosamente na salgadeira para no correr do ano se irem consumindo. As mais magras, do lombo e outra com alguma gordura, guardavam-se para as chouriças e para os torresmos, que se acondicionavam em banha e se guardavam em potes de barro. Os presuntos curavam-se no fumeiro.

Na feira dos Santos, que abria a época oficial da matança do porco, poderia haver algum consumo de carne fresca, mas não com a abundância da atualidade. O consumo de febras era apanágio das classes mais ricas e de casas onde a carne abundava e onde se matava mais de um porco.

 

A carne mais popular da Beira Alta

    Aqui, pela Beira serra, a carne mais consumida em tempo de festa era, de facto, o carneiro. Esta carne, proveniente de carneiros castrados que não tivessem mais de dois anos, era muito apreciada desde os tempos medievos. Os canones médicos consideravam-na, inclusive, muito acomodada para todas as idades, sexo e temperamentos, adiantando-se também que se digeria bem e nutria “maravilhosamente”.  Era até recomendada aos mais fracos, velhos e doentes.  Ao contrário, a carne de vaca era vista como indigesta e era dura e seca, proveniente de vacas com mais de dois anos ou bois já bastante cansados dos trabalhos agrícolas. É claro que o carneiro e a ovelha eram também os animais que mais abundavam nesta região.

Tenho na memória os pratos festivos de carneiro descritos pela minha mãe no seu tempo de juventude e os que ela própria cozinhava. E recordo o texto de Esther Abranches, uma beirã, da primeira metade do século XX, que anota inclusive o consumo de bifes de carneiro.  

 

Uma receita à moda de Mangualde

Foi neste contexto que localizei na obra de Carlos Bento da Maia, editada em 1904, uma receita denominada “costeletas de capado”, que, diz o autor, recolheu em Mangualde. Receitas destas, à moda de Mangualde, são muito raras e, por isso, merecem um destaque especial. E o autor esclarece que um capado é um “chibo ou o carneiro capado e que em Mangualde significa carneiro”.

Comia-se, de facto, muito carneiro nesta região, proveniente dos rebanhos que abundavam por aqui. Hoje, pelo contrário, é uma carne quase ausente dos talhos e dos restaurantes. Apenas o borrego ou o cabrito despertam atenção gastronómica.

Termino com a receita desta pérola da tradição gastronómica mangualdense que, discretamente, mantém a presença do omnipresente porco.




Costeletas de capado

Separam-se as costeletas, batem-se com a cota da faca, esfregam-se com sal, pimenta e alho, e acamam-se numa vasilha de loiça, deitando por cima delas, vinho branco. No dia seguinte ao desta operação, batem-se alguns ovos, conforme a porção de costeletas, molham-se estas no ovo batido, envolvem-se em pão ralado e salsa picada e fregem-se em banha de porco.


              Bom apetite!

 

 
 
 
 
 
 


 

 

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