A rosca do Minho
Hoje, Domingo, logo pela manhã, saí à rua e cruzei-me com um homem que vinha da padaria com uma rosca debaixo do braço. Em Braga esta é uma realidade domingueira. Todos os Domingos as padarias da cidade só cozem e vendem rosca. E quem diz em Braga, diz em muitos concelhos minhotos, onde a produção de rosca, ou regueifa, assim designada junto aos rios Ave, Sousa e Tâmega, está presente no quotidiano da população desde os tempos medievos. É claro que são excepção as padarias dos supermercados, onde outros pães se vendem e a rosca nem sequer está presente, mas nas padarias impera o pão tradicional.
Quem não é do Minho, como eu, ainda se surpreende com esta tradição alimentar. Nos primeiros tempos arriscava-me a perguntar se não havia outro pão, mas cedo percebi que por aqui é este que fala mais alto.
O que é uma rosca?
A rosca é um pão branco feito da flor da farinha de trigo, bem peneirada, que se faz em forma arredondada ou, como nos dizia Raphael Bluteau, no século XVIII, “uma certa maneira de bolo roliço que se vem a fechar em redondo”. Um pão que também pode ser um bolo, se se juntar um pouco de açúcar, erva doce, manteiga e ovos. Roscas deste tipo ainda se fazem por aí e já se faziam no Minho no século XVII. As freiras do convento dos Remédios, em Braga, eram exímias fabricantes deste pão doce, que ofereciam em dias especiais ao médico da casa, ao capelão, aos confessores, ao hortelão, à lavadeira e a outros criados. E de tal forma este pão doce se popularizou que até deu nome ao pão-de-ló, que, na altura da Páscoa, por aqui se denominava, e ainda denomina, a “rosca de pão-de-ló”. Mas aqui, convém dizer, que nem todos se deliciavam com este bolo. Muitas vezes os afilhados recebiam dos padrinhos apenas a rosca de pão branco, sem qualquer outro ingrediente.
O pão de Domingo e dos mais abastados
Todavia, este pão, desde tempos remotos, era apanágio das elites. Os mais pobres comiam pão de milho, ou broa, feito com o chamado milho alvo, painço e centeio e, depois do século XVI, com milho maís, trazido da América dos Sul. Esta presença milenar, primeiro do milho miúdo e depois do maís, fez com que os minhotos fossem apelidados de "picamilhos".
O pão feito de trigo, muito recomendado nos séculos passados, pelos cânones médicos, como mais saudável, era raro por ser pouco produzido na região e no país, e, por isso, muito mais caro. Por essa razão os mais pobres comiam-no apenas em dias de festa e aos Domingos. Já no século XVIII observo que em alguns locais do Minho, especialmente nas tabernas, se vendia a “rosqua” ou “pão branco”. Havia até as padeiras ou regueifeiras que as iam vender junto às Igrejas. Depois da missa, todos, ou os mais remediados, compravam a rosca para acompanhar a comida melhorada de Domingo.
E por aqui, no coração do Minho, continua a manter-se a tradição. Durante a semana as padarias vão fabricando a broa, o molete ou papo-seco, o pão de centeio e outros pães que agora vão aparecendo, mas, ao Domingo, é a rosca que alegra a mesa. Tostadinha por fora e alva, muito alva, por dentro, bem amassada, leve e esponjosa, faz as delícias de todos. Um pão que em algumas padarias me lembra a mim, que sou beirã, o pão espanhol que se trazia de Vilar Formoso!
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