Pastéis de feijão de Mangualde


  


Comer um pastel de feijão do Patronato de Mangualde é um prazer que faz parte do quotidiano dos Mangualdenses. Para quem vive longe esse prazer torna-se um matar de saudades.  
E mesmo que não queiramos a pergunta surge na nossa mente. De onde vem esta receita? Quem a inventou? Será conventual?
A pastelaria do patronato surgiu na década de trinta com o objectivo de  financiar obras de apoio social da paróquia. Neste domínio foi muito importante a acção  de D. Maria Amélia Ortiz Ribeiro que trouxe consigo o seu receituário pessoal onde, entre outros, constava a receita destes deliciosos pasteis. Até aqui nada de novo. Afirmar, com baste nesta história, que a receita é conventual é pura imaginação. Além disso Mangualde nunca teve conventos femininos, havendo apenas uma tentativa de fundar um recolhimento, que não teve sucesso.
Como chegamos então à história deste doce? Recuemos a 1834. Nesta altura um decreto real extingue todos os mosteiro masculinos e femininos. Os frades tiveram que deixar de imediato os seus cenóbios, que foram nacionalizados, mas às freiras, para não cairem na prostituição e na indigência, foi-lhes permitido que continuassem a sua vida conventual até morrer a última freira. Os conventos ficaram apenas proibidos de receber noviças. Este facto levou a que muitos conventos alargassem a sua existência até finais do século XIX e aí permacessem os segredos doceiros, dos doces em que eram especialistas, que continuaram a ser fundamentais para o sustento das freiras que, entretanto, ficaram despojadas de muitos dos seus bens pela nacionalização pública. Mas à medida que as freiras iam morrendo e a comunidade definhando as receitas dos seus doces também foram passando para o exterior, através dos familiares ou das criadas que por aí circulavam. Fora das portas monásticas muitas receitas “emigraram” para bem longe dando origem a negócios particulares. Pelo país encontramos vários exemplos desta realidade como o pão de ló de Alfeizerão, os pasteis de Vouzela e tantos outros. Os pasteis de feijão de Mangualde poderão ter este enquadramento. A D. Maria Amélia Ribeiro  viveu num tempo não muito distante da extinção de algumas casas monásticas e ter consigo  receitas, oriundas de uma qualquer casa conventual, era uma situação muito provável.
Mas será que esta receita, de um doce feito à base de feijão, poderá ter origem num convento, no sentido de ser um doce específico e com alguam tradição de uma qualquer casa monástica ? Depois de alguns anos de pesquisa nos livros de gasto quotidiano de alguns conventos femininos do norte do país, chego à conclusão que sim. Desde o século XVII observo que as freiras tinham por hábito fazer um doce de prato à base de feijão branco ou grão de bico, que comiam nos tempos de jejum, como o Advento e a Quaresma. Chamavam-lhe os feijões ou grãos doces e faziam-nos com o açúcar em ponto ao qual se juntava feijão branco cozido e passado por uma peneira (ou grão de bico) e gemas de ovos.  Observo esta prática em conventos femininos do Porto, de Braga e de Viana do Castelo.
Mas será que este doce também não se fazia fora das portas monásticas? Com certeza que sim.
Depois desta pequena viagem talvez possamos dizer com mais certeza que os pasteis de feijão são um doce com origem em um qualquer convento. Ou não!
Então, retemperemos com eles as forças e … a alma!

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